PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA
EMÍLIA FERREIRO
Emília Ferreiro nasceu na Argentina em 1936.
É psicolinguista, pedagoga, pesquisadora.
Emília Ferreiro nasceu na Argentina em 1936.
É psicolinguista, pedagoga, pesquisadora.
Doutorou-se na universidade de Genebra sob orientação de Jean Piaget.
Na sua trajetória profissional publicou vários livros, realizou pesquisas sobre sobre
a alfabetização. Dedicou-se à educação e atualmente é professora titular do Centro de
Investigação e Estudos Avançados do Instituto Politécnico Nacional da Cidade do México.
Uma das grandes grandes contribuições para o campo educacional foi descobrir como a
criança pensa a respeito da escrita e da leitura quando se inicia no processo de
aprendizagem da alfabetização. Em pesquisas realizadas principalmente com crianças
argentinas e mexicanas, Emília Ferreiro descobriu e descreveu a chamada psicogênese
da língua escrita que mostra como em um processo evolutivo a criança constrói o
conhecimento da escrita. Desvendou os mecanismos pelos quais a criança aprende a ler e
escrever. Suas descobertas trouxeram o novo olhar para o saber
pedagógico da sala de aula. Se antes da psicogênese o foco do processo
Ensino-aprendizagem era no como se ensina, após a psicogênese o foco passa
para como se aprende. Consequentemente isto levou educadores a reverem
radicalmente seus métodos.
Reflexões sobre alfabetização (1981)
é um livro sobre alfabetização que trata da síntese das principais contribuições de
Emília para a história e as descobertas sobre a alfabetização. Reúne quatro trabalhos
desenvolvidos em momentos diferentes, porém dentro da mesma linha de preocupação:
contribuir para uma reflexão sobre a intervenção educativa alfabetizadora a partir de novos
dados oriundos das investigações sobre a psicogênese da escrita na criança.
Importante ressaltar que as investigações de Emília Ferreiro evidencia que
o processo de alfabetização nada tem de mecânico do ponto de vista da criança
que aprende. A autora nos chama atenção para a forma de alfabetizar que se perpetuou
durante durante longos anos dentro da escola e nos diz que tradicionalmente
alfabetização é considerada em função da relação entre o método e o estado de
maturidade ou de prontidão da criança. Isso significa que no processo de
ensino-aprendizagem toda a ênfase dada ao método utilizado pelo professor estará vinculado
a maturidade da criança / pré-requisito para aprendizagem.
Nessa forma de pensar a alfabetização os dois pólos (quem ensina e quem aprende)
têm sido caracterizados, mas só esses elementos não são suficientes, falta um terceiro
elemento nessa relação: a natureza do objeto do conhecimento, a natureza da escrita.
De acordo com Emília a escrita pode ser concebida de duas formas muito diferentes
a primeira como um código de transcrição gráfica das unidades sonoras e
a segunda como um sistema de representação da linguagem e conforme o modo de
considerá-las as consequências pedagógicas mudam drasticamente.
Neste ponto, cabe a pergunta:
Qual é a diferença entre as duas formas de considerar a escrita?
Vejamos: ao concebermos a escrita como código de transcrição que converte as unidades
sonoras em unidades gráficas, ou seja, o som das letras convertem-se em escrita das letras,
coloca-se em primeiro plano a discriminação visual e auditiva como pré-requisito para a
alfabetização. Isso acontece porque acredita-se que se a criança não tenho dificuldade
para para discriminar entre duas formas visuais próximas que são as letras e entre duas
formas auditivas próximas que são os sons e se não apresenta nenhuma dificuldade
para desenhá-las não deveria existir dificuldade para aprender a ler, visto que escrever
se trata de uma simples transcrição do som para um código visual.
Essa forma de conceber a escrita está inserida na concepção tradicional alfabetização
cujo modo de considerar a escrita infantil consiste em prestar atenção apenas nos
aspectos gráficos das produções infantis ou do aprendizando.
Esses aspectos se referem a qualidade do traçado das letras e considerações do tipo
“escreve da direita para esquerda de cima para baixo etc.” ignorando os aspectos
construtivos no processo de aquisição da escrita.Ao concebermos aprendizagem da escrita
como a compreensão do modo de construção de um sistema de representação o
problema se coloca em termos completamente diferentes. embora a criança saiba falar
adequadamente e faça todas as discriminações perceptivas, isso não resolve o problema
central da aprendizagem da língua escrita.
Aqui cabe outra pergunta: Qual é o problema central da aprendizagem da língua escrita?
O problema consiste em compreender a natureza do sistema de representação da escrita
o quê significa compreender porque alguns elementos essenciais da língua oral não estão
presentes na representação, ou seja, não estão presentes na escrita.
Um desses elementos entre outros é a entonação da voz.
Isso acontece porque todas as palavras são tratadas como equivalentes na representação
apesar de pertencerem a classes diferentes.
A consequência dessa dicotomia em relação a forma de conceber a escrita se expressa
em termos muito mais dramáticos. se a escrita é concebida como código de transcrição,
sua aprendizagem é compreendida apenas como uma aquisição de uma técnica de
memorização. neste caso, a criança precisa memorizar o alfabeto as sílabas e as palavras.
Se escrita é concebida como sistema de representação sua aprendizagem se converte em
apropriação de um novo objeto do conhecimento não conceitual.
Nessa forma de pensar a escrita, leva-se em consideração os aspectos construtivos
e esses aspectos têm a ver com o quê se quis representar e os meios utilizados para criar
diferenciações entre as apresentações.
Neste caso, as crianças realizam explorações para compreender a natureza da escrita
e durante todo o processo de evolução produzem escritas a partir da elaboração de suas
hipóteses.
Os indicadores mais claros destas explorações são suas produções espontâneas do ponto
de vista construtivo.
Segundo Emília Ferreiro, a escrita infantil segue uma linha de evolução surpreendentemente
regular e podem ser distinguidos três grandes períodos de evolução os quais iremos expor
neste momento:
Primeiro período
A criança não faz a distinção entre o modo de representação icônico e não icônico.
(lembrando que icônico significa desenho e não icônico escrita).
Segundo período
Começa haver uma construção de formas de diferenciação que se caracteriza pelo
aparecimento de controle progressivo das variações sobre os eixos quantitativos e
qualitativos
Terceiro período
A fonetização da escrita que se inicia com o período silábico e culmina com o período
alfabético .
De uma forma detalhada vamos descrever cada um dos períodos de evolução que
caracteriza o processo evolutivo da escrita infantil:
* No primeiro período aparecem duas distinções básicas:
A primeira é que a criança começa a distinguir entre desenhar e escrever e
na segunda a criança concebe a escrita como um conjunto de formas arbitrárias e lineares.
Podemos observar estas distinções na produção de Adriana de 4 anos e 5 meses de idade
que fez parte das pesquisas de Emília Ferreiro.
Foi solicitado que Adriana fizesse um desenho e a partir dessa produção desenvolveu-se
um diálogo entre a criança e a pesquisadora:
- O quê você desenhou ?
- Um boneco!
- Dê nome a este boneco.
Adriana coloca um rabisco a direita do desenho.
- O que você colocou?- Ale! (irmão de Adriana)
- O quê significa que a Adriana leu rabisco.
- Desenhe uma casinha.
- O que é isso?
- Uma casinha!
-Põe o nome.
Adriana coloca um rabisco a direita do desenho.
- O quê você colocou?
- Casinha.
Mais uma vez Adriana leu o rabisco como era de se esperar.
- você sabe colocar o seu nome?Colocou quatro rabiscos separados.
- O que é isso?- Adriana, meu nome.
-Onde diz Adriana?
Neste momento Adriana assinala globalmente todo o rabisco.
- Porque tem quatro pedacinhos?
- Por que sim.
-O que diz aqui? (no primeiro pedacinho)
- Adriana!
- E aqui? (no segundo pedacinho).
-Alberto. (Pai de Adriana).
- E aqui? (aponta para o terceiro pedacinho)
-Alê (seu irmão)-
E aqui? (apontando para o quarto pedaço).-
Tia Picha...
Observando o diálogo e a produção da criança podemos constatar a distinção que Adriana
fez entre escrever e desenhar e a forma arbitrária que ela usou para representar a escrita,
os rabiscos. Podemos também perceber o conhecimento que ela já tem a respeito da
escrita. Ela sabe que escrever é diferente de desenhar e usa formas para representar
a escrita dos nomes (rabiscos). Ela também sabe que o quê está escrito é para ser lido.
A forma como utilizou o espaço do papel mostra que ela sabe que se escreve da esquerda
para direita, e de cima para baixo. Esta escrita que caracteriza o primeiro período de
evolução. É surpreendente observar uma escrita de uma criança que parece não saber
nada sobre a escrita e descobrir o quanto de conhecimento ela já foi já possui.
escrita. Ela sabe que escrever é diferente de desenhar e usa formas para representar
a escrita dos nomes (rabiscos). Ela também sabe que o quê está escrito é para ser lido.
A forma como utilizou o espaço do papel mostra que ela sabe que se escreve da esquerda
para direita, e de cima para baixo. Esta escrita que caracteriza o primeiro período de
evolução. É surpreendente observar uma escrita de uma criança que parece não saber
nada sobre a escrita e descobrir o quanto de conhecimento ela já foi já possui.
*No passo seguinte a Emília Ferreiro apresenta o segundo período de evolução,
este período é caracterizado pela busca de diferenciações entre as escritas
produzidas para dizer coisas diferentes.
Neste período a criança pensa palavras sendo escritas de formas diferentes.
Começa então uma busca difícil e muito elaborada de modos de diferenciação da escrita.
Segundo a autora, é um período de grande esforço intelectual, pois as crianças estabelecem
critérios de diferenciação entre as escritas e esses critérios se estabelecem sobre dois eixos:
eixo quantitativo e eixo qualitativo
--No eixo quantitativo a criança apresenta variações da quantidade de letras de uma escrita para outra para obter escritas diferentes e também estabelece
a quantidade mínima de letras que a escrita deve ter para que diga algo, ou seja,
possua significado. Nesse momento a criança pensa no seguinte critério
“Para que uma escrita ser interpretada deve ter no mínimo 3 letras”.
--No eixo qualitativo a criança busca a qualidade da escrita e por isso varia o repertório
de letras que irá utilizar de uma escrita para outra.
Podemos observar essas variações na produção de Carmelo 6 anos e 2 meses
de idade que fez parte das pesquisas de Emília Ferreiro.
Foram ditadas para Carmelo as seguintes palavras:
-Coloque o seu nome.
-Carmelo Henrique Castilho Avelani.
Que representou com uma letra para o nome e sobrenome
-Escreva a vaca.
Ele também apresentou com letras do seu nome porém em ordens diferentes.
- Mosca.
Ele usou as letras do seu nome e procurou utilizá-las de forma também alternadas
- Borboletas.
Ele usou todas as letras do nome e colocou mais alguma letra. Observe nesse momento
e esforço intelectual que a criança faz para escrever de forma diferenciada.
- Escreva a cavalo.
Novamente ele usou apenas letras para que a palavra cavalo não se parecesse com
nenhuma outra das palavras ditadas.
E, finalmente, ele escreve “ mamãe come tacos” que também é uma variação de letras
intercaladas sem relação direta com o seu nome.
Observando a produção Henrique percebemos seu pequeno repertório de letras.
Ele usa as letras do nome para escrever e usa sempre as mesmas letras.
Observamos também que existe um esforço intelectual muito grande
(parou de ordenar as letras de forma que a escrita das palavras torna-se totalmente
diferenciada). Há também uma preocupação com a quantidade de letras para se conservar
sempre a mesma quantidade. Essas diferenciações caracterizam o segundo período
evolução da escrita.
* No terceiro período a criança começa por descobrir que a quantidade de letras com
que vai escrever uma palavra pode ter a ver com a quantidade de partes que se reconhece
na expressão oral da palavra. Na verdade essas partes da palavra são aquilo que
chamamos sílabas. Inicia-se assim o período silábico.
Nesse período a criança começa a escrever uma letra para representar cada sílaba
da palavra. Esta hipótese silábica é a de maior importância por duas razões:
a primeira é que permite que a criança obtenha um critério geral para regular
as variações na quantidade de letras que devem ser escritas. E qual seria esse critério?
Uma letra para cada sílaba da palavra.
A segunda razão é que a criança concentra a sua atenção nas variações sonoras entre
as palavras,no entanto, a hipótese silábica cria condições de contradição.
A primeira contradição aparece entre o controle silábico e a quantidade mínima de letras
que uma escrita deve possuir para ser interpretada.Exemplo: o monossílabo deveria-se
escrever com uma única letra,mas colocar uma letra só significa que o escrito não se pode
ler de acordo com a Interpretação da criança. Essa contradição ocorre porque a criança
acredita que para ler palavras escritas tem que ter no mínimo três letras.
A segunda contradição refere-se a interpretação silábica e a escrita produzida pelos
adultos que sempre terão mais letras do que a hipótese silábica permite antecipar.
Vejamos a escrita do Francisco 6 anos de idade que também participou das pesquisas
de Emília Ferreiro.
* No terceiro período a criança começa por descobrir que a quantidade de letras com
que vai escrever uma palavra pode ter a ver com a quantidade de partes que se reconhece
na expressão oral da palavra. Na verdade essas partes da palavra são aquilo que
Nesse período a criança começa a escrever uma letra para representar cada sílaba
da palavra. Esta hipótese silábica é a de maior importância por duas razões:
a primeira é que permite que a criança obtenha um critério geral para regular
as variações na quantidade de letras que devem ser escritas. E qual seria esse critério?
Uma letra para cada sílaba da palavra.
A segunda razão é que a criança concentra a sua atenção nas variações sonoras entre
as palavras,no entanto, a hipótese silábica cria condições de contradição.
A primeira contradição aparece entre o controle silábico e a quantidade mínima de letras
que uma escrita deve possuir para ser interpretada.Exemplo: o monossílabo deveria-se
escrever com uma única letra,mas colocar uma letra só significa que o escrito não se pode
ler de acordo com a Interpretação da criança. Essa contradição ocorre porque a criança
acredita que para ler palavras escritas tem que ter no mínimo três letras.
A segunda contradição refere-se a interpretação silábica e a escrita produzida pelos
adultos que sempre terão mais letras do que a hipótese silábica permite antecipar.
Vejamos a escrita do Francisco 6 anos de idade que também participou das pesquisas
de Emília Ferreiro.
Foi solicitado que Francisco escrevesse as seguintes palavras:
Francisco, Maripoza (borboleta)Paloma (pomba) , pájaro (pássaro), gato e pez (peixe).
Observou-se que a criança escreveu uma letra para cada sílaba e escolheu as letras
que de fato representam o som das sílabas a palavra pez ele fez duas tentativas todas
elas com três letras para representar a palavra monossílaba.
Com Francisco constatamos que em quase todas as escritas ele coloca uma letra para
representar a cada sílaba da palavra e observa-se que a letra escolhida é a que representa
o som da sílaba. Essa escrita representa a hipótese da escrita silábica com valor sonoro
Quando a criança descobre que a sílaba não pode ser considerada como
uma unidade começa o último passo da compreensão do sistema socialmente estabelecido
e a partir daí a criança descobre novos problemas, pelo lado quantitativo,
não basta uma letra por sílaba.
Também não se pode estabelecer nenhuma regularidade
duplicando a quantidade de letras por sílaba já que as sílabas se escrevem
Também não se pode estabelecer nenhuma regularidade
duplicando a quantidade de letras por sílaba já que as sílabas se escrevem
com uma, duas, três ou mais letras.
Pelo lado qualitativo, a criança enfrenta os problemas ortográficos que surgiram a partir daí
Como por exemplo, a identidade do som não garante a identidade de letras e,
tampouco, a identidade de letras garante a identidade dos sons. Por exemplo,
a palavra casa escrita com z (no espanhol) garante a identidade do som, mas não
garante a identidade da letra. O que se constitui aquilo que chamamos erro.
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